16 de nov. de 2009

O viés funcional do processo civil

Trata-se de REsp em que se discute a correção de acórdão que considerou indispensável a propositura de ação cautelar prévia e autônoma de exibição de documentos para obtenção de cópia de contrato de consórcio de veículos a que a autora alega ter aderido. In casu, a autora, ora recorrente, em vez de valer-se de cautelar preparatória, ajuizou diretamente a ação principal, discutindo o contrato e pleiteando a devolução de parcelas pagas, com a requisição incidental de exibição do contrato. No julgamento, nesta instância especial, inicialmente, observou-se que a regra, no Processo Civil brasileiro, é que a petição inicial deve ser instruída com os documentos que fundamentam a pretensão do autor, indispensáveis à propositura da ação. A produção de prova documental posterior, pelo sistema do código, somente é admissível quanto a fatos posteriores ou para impugnação de alegações da parte contrária. Desse modo, mediante uma interpretação literal e estática dessas normas, assistiria razão ao Tribunal a quo ao concluir que o contrato de consórcio, bem como os recibos de pagamento, são documentos indispensáveis à propositura da ação declaratória de nulidade de cláusula cumulada com cobrança. Com efeito, a visão clássica do processo determinaria que, ante a inexistência de tais documentos em poder da autora, competiria a ela, nos termos do art. 844 e seguintes do CPC, propor ação cautelar preparatória e, somente após concluído o procedimento cautelar, concluir pela conveniência ou não de ajuizar a ação principal. Sem isso, a petição inicial estaria incompleta, competindo ao juízo indeferi-la nos termos do art. 284, parágrafo único, do CPC. Por outro lado, contudo, ressaltou-se que o Processo Civil moderno tem, na máxima medida possível, de se direcionar a uma solução de mérito. As nulidades processuais somente podem ser decretadas em casos extremos, em que esteja clara a ofensa a princípios fundamentais do processo. Destacou-se que, entre as modalidades de exibição de documentos, a que mais se adéqua à intenção da autora, no ponto de vista técnico, de fato, é a exibição preparatória. Mas, na situação concreta, não há prejuízo em decorrência da formulação incidental do pedido de exibição. Na contestação, o recorrido, em momento nenhum, alegou não existir o contrato em que se funda o pedido, ao contrário, demonstrou conhecimento acerca da existência do grupo de consórcio ao qual supostamente aderiu a autora. Assim, a falta do documento na petição inicial não inviabilizou a defesa do réu. Todas as questões dúbias quanto à existência do contrato, quanto aos montantes pagos ou quanto à transferência do grupo de consórcio a outro administrador poderiam ser solucionadas mediante a aplicação direta das regras que disciplinam a exibição incidental de documentos, sem necessidade de medida cautelar preparatória. Com esses argumentos, entre outros, a Turma deu provimento ao recurso. Precedente citado: REsp 1.068.040-GO, DJe 16/12/2008. REsp 896.435-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 27/10/2009.

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