3 de jun. de 2006

O marido que se escafedeu

"Anula-se o casamento de homem que, após consorciar-se com mulher virgem, a abandona dois dias depois da cerimônia".
Esse texto sisudo dá desfecho judicial a um caso que sacudiu uma cidade da chamada "Grande Passo Fundo". Valter e Maria tiveram um namoro raro por causa de um importante diferencial: ela era virgem e assim se conservou até a noite de núpcias, por mais que o galante jovem falasse em modernismo e até forçasse a barra.
Depois de um ano e meio de namoro, os dois casaram em 2 de agosto. Foram, então, duas noites - e talvez manhãs e tardes também - de alguns carinhos, descobertas, surpresas e farsas. Mas antes do amanhecer do dia 4, Valter desapareceu após deixar uma fria carta de despedidas. "Parti e não volto mais" - foi uma das frases pungentes. Em estado de choque, Maria foi internada no hospital da cidade, “para tratamento clínico por reação paranóica aguda”. O médico atestou “existência de conjunção carnal recente”.
Refeita parcialmente do drama, três semanas depois a jovem desprezada ingressou com ação anulatória de casamento, que não foi contestada. O juiz Souto nomeou a doutora Raymunda como curadora ao vínculo. A sentença foi a óbvia: decretou a anulação do casamento. Por cautela, a curadora recorreu.
O relator analisou a prova testemunhal, leu, releu e tresleu o depoimento pessoal da lesada. E confidenciou sua estupefação aos colegas de Câmara e ao procurador de Justiça. "Todas as testemunhas se declararam incrédulas com a fuga de Valter, que dizia amar Maria". Ao confirmar a sentença, a Câmara deixou - digamos - um consolo para a mulher abandonada. "O fujão não tinha nenhum afeto pela cônjuge, só lhe revelando tal fato na noite de núpcias após havê-la deflorado - e talvez reste a ela o consolo de não ter tido que aguardar meses ou anos para constatar que ele era um mau-caráter" – refere um dos votos. Maria voltou à casa dos pais, onde talvez guarde cópia do acórdão.
Este é elogioso aos predicados da mulher abandonada e acre crítico do marido fujão: “mesmo sabendo da arraigada formação religiosa da moça, Valter levou-a ao tálamo conjugal, possuiu-a e, a seguir, escafedeu-se para o Mato Grosso.”

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