1 de fev. de 2007

O direito de demandar deve ser exercido com seriedade

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL 7° JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (CONSUMIDOR). CAMPO GRANDE-MS. Autos n° 2003.168.0057-0
S E N T E N Ç A I- M. R. de S., militar (RG n.° XXXX MEC, residente na Rua XXX (CEP XXXX), nesta Capital, propôs a presente Ação de Restituição de Valores, cumulada com Indenização, em face de Telems - Brasil Telecom S/A., regularmente inscrita no CNPJ 76.535.764/032428, pleiteando a condenação da ré na devolução de R$ 2,16, valor que lhe foi cobrado indevidamente, e indenização por danos morais. Face a norma disposta nos artigos 43 da Lei 1.071/90 e 38, caput, da Lei 9.099/95, deixo de proceder ao relatório. II - DECIDO. Busca o autor a restituição da importância de R$ 2,16 (dois reais e dezesseis centavos), cobrada indevidamente em sua conta telefônica, pois alega ter realizado ligações locais para o telefone de sua filha e que referidas ligações aparecem como interurbanos para a cidade de Fátima do Sul (f. 5); procurou a empresa-ré para que referido valor lhe fosse restituído em dinheiro, o que não ocorreu, mesmo diante da admissão, por esta, de falha em seu sistema, tratando-o, na oportunidade, com descaso. 0 autor, então, procurou o PROCON e duas tentativas de conciliação no órgão restaram frustradas, tendo em vista a alegação da empresa de somente efetuar a devolução de valores, em dinheiro, a seus clientes quando o valor for superior a R$ 10,00 (dez reais), e que no seu caso somente poderia abater o valor do crédito em sua conta telefônica. Diante da "humilhação", procurou o Judiciário, requerendo a devolução do valor de R$ 2,16 e R$ 3.997,84 (três mil, novecentos e noventa e sete reais e oitenta e quatro centavos), a título de indenização por danos morais. Em sua defesa, a ré argúi que a ocorrência da irregularidade ocorreu pelo fato de a operadora de telefonia móvel Americel, afrontando determinação da ANNEL, ter alterado unilateralmente as suas áreas de tarifação, quedando a ré impossibilitada de identificar adequadamente o destino das novas numerações. Quanto ao dano moral, alega que no fato ocorrido não há configuração de ato ilícito por absoluta falta de provas da existência de dano. Através de atenta análise dos autos, constata-se que, embora tenha direito à restituição do que pagou indevidamente à ré, o autor, como se verá, abusou do direito de demandar. Pois bem. Não procede a alegação da ré, de não ser a responsável pela cobrança incorreta, pois é com ela que o autor possui vínculo contratual de prestação de serviços telefônicos e em seu proveito realizou os pagamentos. Tem, pois, o autor o direito de exigir a restituição do que pagou por serviço que não lhe foi prestado pela ré, independentemente de culpa desta. Aliás, a ré não contesta o valor pleiteado a tal título. Comprovada a atuação irregular da empresa, deve ser compelida a restituir imediatamente, em dinheiro, os R$ 2,16 pleiteados pelo autor. Contudo, a nada mais tem direito o autor, que -- tivesse agido com bom senso, como sempre se espera de um cidadão (especialmente quando integrante das Forças Armadas) --, diante das reiteradas propostas da ré, já teria solucionado o seu problema há meses, sem maiores custos aos contribuintes, que sustentam muitos dos que tiveram de perder tempo com este processo, seja na elaboração de algumas peças, seja pelo simples fato de ter de pôr os olhos sobre elas. É certo que o direito pátrio acolhe, sem reservas, a indenização pelo dano moral, sob a forma de uma compensação econômica em relação ao sofrimento e às dores mais íntimas de uma pessoa em função de um determinado ato ilícito. Entretanto, no caso em questão, não houve dano e o nexo de causalidade entre ele e o ato ilícito que o teria produzido. Com efeito, o autor quer ser indenizado por danos morais com base no descaso com que, alega, fora tratado por funcionário da ré quando pleiteava a devolução, em dinheiro, de valor a ele devido. Segundo o autor, o funcionário da empresa lhe dissera: ":.. se o senhor achaque tem direito, vai então procurá-los" Ao ser questionado em audiência, declarou o autor: 'á reclamada se negou a devolver em dinheiro; porém, disse que o referido valor poderia ser abatido em próxima fatura, [o] que não foi aceito pelo autor.... Que não foi humilhado, nem maltratado na empresa reclamada; porém, se sentiu constrangido com a forma que lhe foi respondido': Como se vê, não houve lesão à honra ou à moral do autor, pois, se se entender que situações corriqueiras ou meros dissabores do dia-a-dia sejam capazes de ensejar indenizações por danos morais, certamente estaríamos diante da banalização do instituto, que - algum douto já escreveu -, não existe para proteger as suscetibilidades exacerbadas ou para favorecer os chatos. Ora, não é a simples discordância de uma reclamação motivo suficiente para autorizar a concessão de danos morais. Do contrário, toda sentença que viesse a acolher um pedido, deveria condenar o vencido a pagar danos morais ao vencedor. III - Pelo exposto, julgo procedente,, em parte, o pedido, para condenar a ré a pagar ao autor, a título de restituição, a importância de R$ 2,16 (dois reais e dezesseis centavos), corrigida pelo IGP-M/FGV a partir do efetivo desembolso, acrescida de juros legais de 1% ao mês (CC, art. 406; CTN, art. 161, § 1% contados da citação. Comprove o autor a data em que pagou a conta reproduzida à f. 5. Em seguida, à Contadoria para o cálculo e apurar as despesas processuais, a cujo ônus, por reputá-lo litigante de má-fé (CPC, art. 17, 4, condeno o autor (Lei n. 9.099/95, art. 55, primeira parte). IV - E o faço porque, como se viu, conquanto tenha recebido, desde o início de sua reclamação reiteradas promessas, por parte da ré, de que o estorno dos R$ 2,16 poderia ser feito por meio de crédito nas suas contas/faturas seguintes ( petição inicial, documento de f. 3 e o depoimento pessoal), o autor não aceitou tal proposta, que, além de sensata, não lhe representava nenhum dano. Como militar do Exército, é provável tenha perdido algumas horas de serviço para comparecer a duas audiências no PROCON, nos dias 18 e 20 de dezembro de 2002; a este Juizado, no dia 10-1-03, para ajuizar esta ação, e a duas outras audiências nesta Vara (uma de conciliação e outra de instrução e julgamento), nos dias 18-2-03 e 3-4-03. No caso, eventuais faltas do autor, ao serviço, para queixar-se de nada (notese que os R$ 2,16 lhe seriam restituídos por meio de crédito nas faturas seguintes), configuram verdadeiro exercício predatório da cidadania e prejuízo ao Serviço Público, à sociedade e ao Poder judiciário, que, atulhado de serviço, não pode suportar demanda por motivos tão banais - que custa ao contribuinte várias dezenas de reais --, como os alegados pelo autor, que, parece, acionou a máquina do Estado (PROCON e judiciário) por recreação ou por mero espírito de emulação. Sua atuação (somadas eventuais faltas ao serviço à utilização do PROCON e dos serviços auxiliares do judiciário, desde a elaboração do pedido à prolação da sentença), configura verdadeiro abuso do direito de demandar e desperdício de recursos públicos, o que é inadmissível. Deve, por isso, pagar, além das custas, os honorários advocatícios, que fixo, com modicidade, em R$ 100,00. Extraia-se cópia de f. 13 e desta decisão e remeta-se ao Comando local do Exército, a que serve o autor, para, se for o caso, adotar as providências entender pertinentes. Igual expediente deve ser encaminhado à COOORDENADORIA PARA ORIENTAÇÃO E DEFESA DO CONSUMIDOR - PROCON. Campo Grande, 30 de maio de 2003 Fabricio Venhofen Martinelli Juiz Leigo Homologo a presente sentença com fundamento no artigo 40 da Lei 9.099/95, para que surta os efeitos legais. Juiz DJAILSON DE SOUZA .

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